A missão, chamada de DAVINCI, será lançada em 2029 e investigará, entre outras coisas, os gases da atmosfera e a possível existência de um oceano no passado venusiano.
Apesar do nome famoso, o projeto não tem relação com o artista e inventor renascentista italiano Leonardo da Vinci, mas deriva do acrônimo, em inglês, “Deep Atmosphere Venus Investigation of Noble Gas, Chemistry, and Imaging” e, em uma tradução livre, poderia ser chamado de Investigação Profunda de Gases Nobres, Química e Imagem da Atmosfera de Vênus.
A missão será capaz de medir aspectos da atmosfera do nosso vizinho planetário com um nível de detalhes nunca antes alcançado. Vale lembrar que a NASA enviou apenas duas missões para Vênus em toda sua história: a Pioneer, em 1978, e a Magellan (ou Magalhães), em 1989.
Um dos experimentos do “laboratório voador de química analítica” investigará a relação entre a quantidade de hidrogênio (H) e deutério (D), um isótopo mais pesado do hidrogênio que contém, além de um próton em seu núcleo, um nêutron. Segundo os cientistas, medidas quantitativas da relação entre água deuterada ou pesada (D₂O) e água normal (H₂O) pode fornecer pistas sobre a evolução geológica de Vênus.
Conforme alguns modelos de evolução planetária, após a evaporação da água presente em um oceano primitivo e quente, houve uma perda maior de hidrogênio para o espaço sideral frente à perda do deutério, que exibe o dobro do peso. Hoje, medida apontam para uma razão D₂O/H₂O 120 vezes maior no nosso vizinho quando comparada com a mesma razão aqui na Terra, o que sugere padrões de comportamento planetário distintos entre Vênus e Terra.
Essa diferença, conforme alguns estudos, pode ter sido o fator crucial que permitiu o surgimento e a evolução da vida aqui na Terra. Alguns estudos vão além: eles sugerem que a vida também teria surgido no planeta venusiano, mas como as condições planetárias mudaram ao longo de bilhões de anos, somente o ambiente terrestre foi capaz de manter a vida até os dias atuais. Hoje, Vênus é um planeta com temperaturas de superfície que chegam a 450 °C e uma atmosfera 90 vezes mais espessa que a do nosso planeta composta de 97% de dióxido de carbono (CO₂), 2% de nitrogênio (N₂) e 1% de outros compostos como, por exemplo, ácido sulfúrico (H₂SO₄).
Além disso, a DAVINCI irá mapear a superfície e detectar a composição de algumas das montanhas de Vênus por meio de imagem obtidas utilizando a técnica de infravermelho. Alguns pesquisadores acreditam que os resultados obtidos poderão traçar um panorama semelhante ao cenário dos continentes da Terra, o que poderia indicar que Vênus também possui placas tectônicas.
A sonda conta com escudo térmico para protege-la na descida. Quando o instrumento estiver cerca de 70 quilômetros acima da superfície, ele descartará esse escudo para realizar a coleta e a análise dos gases atmosféricos. Logo após passar pela espessa camada de nuvens, a aproximadamente 30 quilômetros de altitude, a sonda capturará centenas de imagens da superfície de Vênus. Caso “sobreviva” ao pouso, os equipamentos poderão permanecer funcionando por até 18 minutos. Após esse tempo, a pressão, a temperatura e o ambiente ácido destruirão a sonda da mesma forma que ocorreu com as sondas do programa soviético Venera.
Assim, ao final da missão, a agência espacial norte-americana espera ter em mãos dados que permitam avaliar a história da atmosfera venusiana, os tipos diferentes de rochas encontradas e as características do ambiente que possam dizer se a superfície de Vênus sofreu algum tipo de erosão ou se já possuiu um oceano de água líquida em seu passado.
Revealing the Mysteries of Venus: The DAVINCI Mission, The Planetary Science Journal, 2022, vol. 3, p. 117.
